segunda-feira, 26 de maio de 2008

O S   V I A J A N T E S   N A T U R A L I S T A S

"Para conhecer toda a beleza das florestas tropicais é necessário penetrar nesses retiros tão antigos como o mundo. Nada aqui lembra a cansativa monotonia de nossas florestas de carvalhos e pinheiros; cada árvore tem, por assim dizer, um porte que lhe é próprio; cada uma tem sua folhagem e oferece frequentemente uma tonalidade de verde diferente das árvores vizinhas. Vegetais imensos, que pertencem a famílias distantes, misturam seus galhos e confundem sua folhagem." Auguste de Saint-Hilaire, em "Voyage dans les provinces de Rio de Janeiro et de Minas Gerais" (1830).


A vinda de estrangeiros ao Brasil para participar de expedições por ambientes naturais, explorando suas belezas e coletando informações científicas, pode parecer uma prática recente. Porém, a atividade já soma muitas décadas de história e aventuras. O início do Século XIX foi marcado por uma leva de estudiosos europeus – adequadamente chamados de “viajantes-naturalistas” – que realizaram incursões pelo nosso território, podendo ser considerados os precursores do que os turistas interessados em participar de práticas científicas fazem hoje.


H u m b o l d t
Um pioneiro a tentar estudar cientificamente o nosso país foi o alemão Alexander von Humboldt, que entre 1799 e 1804 viajou pela América Latina – passando pelos atuais Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Cuba e México – mas foi impedido pelos portugueses de permanecer no Brasil, por ser considerado um possível espião. Em 2000 a Universidade de Brasília (UnB) realizou a Expedição Humboldt, comemorando os 200 anos da viagem original e incluindo no roteiro as localidades brasileiras que eram parte do roteiro do pesquisador.

S a i n t - H i l a i r e
Anos depois acontece a primeira expedição a efetivamente percorrer o território brasileiro. Realizada entre 1816 e 1822, teve como protagonista o botânico francês Auguste de Saint-Hilaire, à época com 37 anos. A maneira de Saint-Hilaire fazer ciência foi marcante: ao mesmo tempo em que estudava o lado mais filosófico da história natural, dedicava-se à efetiva aplicabilidade das pesquisas que realizava. Ou seja, para o pesquisador, ciência teórica e prática se confundiam e misturavam com naturalidade. O “bem-estar da humanidade e a glória nacional” eram os objetivos primordiais da missão de Saint-Hilaire, responsável por remeter às colônias francesas caixas e caixas de plantas nativas do Brasil que tinham aplicação medicinal, alimentícia ou industrial, numa espécie de “biopirataria” primitiva justificada pelos benefícios que esta universalização do conhecimento traria.

F l o r a   B r a s i l i e n s i s
Praticamente ao mesmo tempo, em 1817, vêm ao Brasil dois outros europeus, os alemães Karl Friedrich Philipp von Martius e Johann Baptist Ritter von Spix, botânico e zoólogo, respectivamente. O curioso contexto de sua chegada ao país é parte importante de nossa história: a expedição veio como parte de uma missão austríaca que trazia a arquiduquesa Leopoldina para casar-se com o imperador Dom Pedro I. Durante três anos, os dois cientistas viajaram 10 mil quilômetros pelo interior brasileiro, em especial a região norte, colecionando dados sobre natureza e sociedade. Como resultado, uma publicação que ainda é considerada a obra mais abrangente sobre nossas plantas – a Flora Brasiliensis de Martius – englobando quase 23 mil espécies botânicas. No campo da zoologia, Spix foi o pioneiro em estudos com a fauna da Amazônia, tendo colhido informações básicas fundamentais e consideradas como referência até os dias de hoje, em especial sobre os vertebrados.


E x p e d i ç ã o   L a n g s d o r f f
Logo a seguir viria o físico e naturalista alemão Georg Heinrich von Langsdorff, organizador e líder da famosa Expedição Langsdorff (patrocinada pelo czar russo Alexandre I), que partiu do Rio de Janeiro em 1822 e percorreu cerca de 17 mil quilômetros até 1829. No grupo de 39 exploradores – dos quais apenas 12 sobreviveram até o final, tendo os demais sucumbido às doenças tropicais – havia cientistas, naturalistas e artistas, estes últimos encarregados pelos registros visuais dos lugares visitados. Entre eles destaca-se o pintor e desenhista austríaco Johann Moritz Rugendas. A Expedição Langsdorff foi a primeira a explorar a fundo alguns aspectos da nossa fauna, flora e povos nativos.


E v o l u ç ã o   das   E s p é c i e s
Por fim, em março de 1832, aporta na Bahia o mais célebre viajante-naturalista a visitar o Brasil: Charles Darwin, o pai da Teoria da Evolução das Espécies. Durante sua viagem de cinco anos a bordo do barco Beagle – de 1831 a 1836 – foram elaboradas as bases de sua teoria, publicada 23 anos depois (1859) e até hoje considerada como um dos fundamentos da biologia moderna. Em sua passagem pelo país, Darwin visitou, além da Bahia, o Rio de Janeiro, onde coletou plantas e insetos em localidades como a Floresta da Tijuca e o Jardim Botânico. Dentre os comentários feitos sobre o Brasil, o estudioso inglês revelou-se chocado com alguns hábitos da sociedade brasileira na época, em especial com a escravidão, que abominou publicamente.



Agora, quase dois séculos mais tarde, os “turistas científicos” refazem o caminho dos “viajantes naturalistas”, não mais com a presença de desenhistas para registrar as imagens e nem sendo acometidos por pragas tropicais como a malária. Hoje os artistas deram lugar às sofisticadas câmeras digitais e laptops, e as antes arriscadas expedições aventureiras são muito bem planejadas e organizadas por operadoras de turismo especializadas, em conjunto com cientistas e meios de hospedagem providos de facilidades como piscinas e ar condicionado.


SAIBA MAIS:
Viajantes-naturalistas no Brasil oitocentista:
experiência, relato e imagem

Por Lorelai Kury (Fundação Oswaldo Cruz)
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2 comentários:

Pastel Schaefer disse...

Acho belo o trabalho do desenhista nessas expediçoes, apesar de nao-pratico em comparação às superpotentes cameras. Gosto de dar lá minhas saidas de um mes pra desenhar e desenhar e desenhar no meio do mato, ainda é uma ação pequena que me encanta.
Parabens e obrigado pelo blog e postagens

ARTECIENTISTA
Pastel Schaefer

Anônimo disse...

muito bom, vai ajudar me em um trabalho