sábado, 10 de maio de 2008

P R Ó S   E   C O N T R A S

Foto: © Daniel De Granville, 2004


Como qualquer atividade que envolva questões relacionadas à interação de pessoas em ambientes naturais, é importante avaliar os impactos e sentimentos – positivos e negativos – que o Turismo Científico causa, em especial por se tratar de modalidade relativamente recente e com poucos dados disponíveis sobre estes aspectos. A maneira encontrada para traçar um perfil atual do Turismo Científico no Pantanal foi através de entrevistas realizadas com pessoas diretamente envolvidas em sua execução: pesquisadores, operadores de turismo e turistas que já participaram de um programa assim.

Dentre os cientistas, há uma visão clara sobre o que significa trabalhar em atividades bastante diversas da rotina clássica de um pesquisador acadêmico. “São poucos os cientistas com esse perfil, apesar de serem professores em suas instituições, mas o pesquisador deve enxergar que nestas circunstâncias ele nada mais estaria fazendo do que lecionando de forma prática, a grande missão da profissão que escolheu”, afirma o ecólogo George Camargo, analista de biodiversidade da Conservation International do Brasil e coordenador das atividades com morcegos oferecidas pelo Instituto Earthwatch.

B e n e f í c i o s
Os benefícios trazidos pelo envolvimento de turistas em suas pesquisas vêm, principalmente, na forma de aporte financeiro a seus projetos e no auxílio com as atividades em campo. “Ao pagar para participar de projetos de pesquisa, os voluntários contribuem para a aquisição de equipamentos e até bolsas para estagiários acadêmicos”, continua Camargo. “Outra forma de ajuda é como força de trabalho. A parafernália de pesquisa pode ser pesada, numerosa e desajeitada, necessitando assistentes que podem onerar projetos com poucos recursos. Ao desempenhar funções como esta e ajudarem na coleta e anotação de informações, os voluntários ajudam na consolidação da pesquisa e, do ponto de vista deles, saem com a sensação real de que fizeram um belo papel para a conservação da vida selvagem”, avalia. Sua colega Neiva Guedes, idealizadora do Projeto Arara Azul, vai além: “muitos turistas são pesquisadores ou amantes da natureza e estudam muito, visitam outros projetos mundo afora e acabam contribuindo conosco através da troca de informações. A atividade cria, ainda, mais oportunidades de trabalho para as comunidades, com conseqüente melhoria na estrutura local”.

C u i d a d o s   N e c e s s á r i o s
Obviamente alguns aspectos inspiram preocupação por parte dos pesquisadores, que acabam desempenhando uma função de “guia de turismo” geralmente estranha à sua vivência profissional. Problemas como a inexperiência dos participantes, não só na lida com metodologias científicas, mas também no convívio em ambientes naturais, são algumas das dificuldades relatadas. “Às vezes perde-se um tempo excessivo explicando o trabalho e instruindo os voluntários nas tarefas como a utilização de equipamentos. A falta de consistência na coleta de dados e a não familiarização com os protocolos de coleta podem resultar em anotações distorcidas – mas nada que explanações e treinamento prévio não resolvam, assegurando o sucesso da expedição”, afirma a zoóloga Ellen Wang, que já foi Diretora do Centro de Pesquisa da Earthwatch Institute e pode ser considerada uma autoridade no assunto. Afinal, além de cientista, há anos ela atua regularmente como guia de ecoturismo no Pantanal. “Eu gosto muito desta função. Boa parte de nossos voluntários são educadores que certamente terão papel fundamental na disseminação dos conhecimentos adquiridos durante o período em que passaram na companhia de pesquisadores e moradores locais”.

E x p e r i ê n c i a s
É o caso da norte-americana Kristin Anderson, que trabalha no setor de Responsabilidade Social Corporativa (CSR) da Starbuck’s Coffee em Seattle e esteve no Pantanal em 2006 através do Instituto Earthwatch. “No meu caso foi uma espécie de viagem de negócios. Nós optamos por um projeto científico para posteriormente envolvermos jovens universitários em algum trabalho voluntário expressivo. Mas independente do trabalho, eu procuro passar no mínimo uma semana das minhas férias em alguma atividade que envolva aprendizado ou ensino voluntário, e o Earthwatch oferece a combinação ideal”.

A também norte-americana Carolyn Sheehan visitou a região em julho de 2007 com a NCSU Sci-Link. “A idéia de ir ao Pantanal foi da minha orientadora na Universidade do Tennessee. Quando a bolsa para a viagem foi aprovada, comecei a me informar e a cada conversa com alguém que já tinha ouvido sobre o Pantanal eu ficava mais animada! Foi sensacional vivenciar o que está acontecendo em termos de ensino de ciências e turismo em lugares como os que nós visitamos. Eu acredito muito na educação como um aspecto crucial que deve estar presente no turismo e no ambientalismo, e vi que isto está efetivamente ocorrendo lá”.

I m p a c t o s   N e g a t i v o s
Ao contrário dos impactos positivos trazidos pelo envolvimento de turistas com cientistas em áreas naturais, os riscos oferecidos ao ambiente pantaneiro parecem ainda não estar muito claros. Em termos gerais, o relato dos pesquisadores não difere muito dos impactos causados pelas modalidades tradicionais de turismo de natureza: trânsito constante de pesquisadores e voluntários numa mesma, área afugentando animais (em especial no caso de grupos muito grandes) e coleta não-autorizada de material (penas, frutos, material genético), foram alguns dos aspectos negativos citados pelos especialistas.

O biólogo Dino Xavier Zammataro especializou-se na operação de programas com cunho científico, em especial estudos do meio para escolas do ensino fundamental e médio, tendo trabalhado em duas conhecidas operadoras turísticas de São Paulo. Ele alerta para alguns impactos que podem advir de atividades mal administradas. “Com relação às atividades em ambiente natural, devem ser seguidas todas as recomendações para minimizar o impacto da visitação, como em qualquer grupo de turismo. Cuidados especiais devem ser tomados quando as atividades prevêem a interferência direta no objeto a ser estudado, como captura de fauna ou de flora para observação e posterior soltura. Deve-se prestar atenção às épocas onde as populações podem ficar mais vulneráveis a interferências, como épocas de nidificação, acasalamento, procriação. Como regra, a manipulação direta de fauna e flora só deve ser feita se for essencial para a pesquisa em andamento”.

No campo social, Dino considera que a visita e interação próxima dos turistas com as comunidades e moradores locais tradicionais deve ser muito bem preparada. “Os turistas devem ser preparados para que não causem impacto nos costumes locais. A postura e comportamento devem ser adequados às práticas locais, e a comunidade a ser visitada também deve ser preparada. A valorização e fortalecimento da cultura local é essencial para que valores e costumes dos visitantes não se sobreponham aos locais”, ressalta.

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